Quotas Preferenciais: a que Vieram?
Nas sociedades limitadas, os quóruns qualificados para deliberação de diversas e importantes matérias, a exemplo da necessidade de se ter aprovação de sócios que representem 75% do capital social para alterar contrato social ou para realizar operação de cisão ou incorporação, são uma questão controvertida, sem dúvidas.
De forma muito clara, o Código Civil, ao disciplinar as sociedades limitadas, estabelecendo tais quóruns, buscou qualificar o controle e tentar evitar abuso de direito por parte dos sócios majoritários, muito frequentes sob a regulação anterior. Ao fazer isso, converteu o percentual de participação no capital em importante unidade de medida de poder político nessas sociedades.
Esse referencial foi recentemente relativizado pela Instrução Normativa (IN 81) do Departamento de Registro de Empresa e Integração (DREI), órgão federal que normatiza funcionamento das Juntas Comerciais nos Estados e DF, ao admitir expressamente as chamadas “quotas preferenciais”.
Indo além do possível, talvez, para uma IN, estipulou-se que o contrato social poderá prever a regência supletiva pelas normas das S/A ou que se presumirá tal supletividade (ou seja, a possibilidade de – a grosso modo – se preencher lacunas do contrato social com as normas da Lei das S/A) caso a sociedade limitada adote, dentre outros institutos típicos da S/A, as quotas preferenciais (na S/A são ações). Mas o que implica admitir quotas preferenciais? Mudança radical na equação do poder político dos sócios.
As quotas preferenciais, apesar de representativas do capital, podem ter classes distintas, em proporções e condições definidas no contrato social, atribuindo-se a seus titulares direitos econômicos e políticos diferentes da quota ordinária (para usarmos nomenclatura da S/A), como, por exemplo, limitação ou supressão do direito de voto, em troca de uma preferência no recebimento de dividendos (lucros).
Trazer isso para Limitada, no dizer da IN 81, representa “para efeito de cálculo dos quóruns de instalação e deliberação previstos no Código Civil” que serão consideradas apenas as quotas com direito a voto.
Se por um lado, isso pode aumentar a possibilidade de captação de investimentos por uma sociedade, o que é bom, claro, por outro, traz inescapáveis ponderações.
Em uma S/A, os acionistas são usualmente mais protegidos pela limitação da responsabilidade, seja por força da arquitetura legal, seja pela consolidada jurisprudência, que direcionam suas atenções para a atuação dos administradores. Numa Ltda, notadamente no âmbito trabalhista, os quotistas, mesmo minoritários e sem poder de administração, não contam com a mesma proteção, apesar da lei estabelecer a limitação da responsabilidade. Ou seja, como estar numa sociedade, sem qualquer direito de voto e estar sujeito a eventuais responsabilizações?
Da perspectiva de controladores da Ltda, também surgem deveres conexos a essa nova relação com investidores sem direito de voto, já que mais presente fica o dever de prestar contas com transparência, um aspecto controvertido nas limitadas; bem como devem deliberar considerando não apenas os próprios interesses, mas, também, os dos minoritários, como manda a Lei das S/A. É de se questionar quantos controladores de limitadas estariam dispostos a fazer isso.
Assim, é preciso avaliar de forma qualificada e se questionar: vale a pena investir (e ser responsabilizado), sem poder deliberar? De outro lado, a sociedade está pronta para lidar com os deveres que surgem com as quotas preferenciais?
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