Quando o contribuinte apresenta recurso contra decisão da Receita Federal, o julgamento é realizado pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF. As turmas e câmaras deste conselho, por sua vez, são formadas por representantes do fisco e dos contribuintes, em mesmo número e, em caso de empate, a questão era definida pelo voto de qualidade, proferido pelo presidente, invariavelmente representante do Fisco.
A referência é no passado pois, em abril, através da Lei do Contribuinte Legal (Lei 13.988/20), o voto de qualidade foi extinto no contexto do CARF e, assim, em caso de empate, passou-se a se resolver a questão favoravelmente ao contribuinte.
Ocorre que, na última sexta-feira, foi publicada a Portaria do Ministério da Economia nº 260/20, sob o pretexto de que a norma que extinguiu o voto de qualidade comportaria regulamentação e, até mesmo, permitiria a manutenção do voto de qualidade (extinto!) em determinadas situações.
Em realidade, o Ministério da Economia, sem competência para tanto, regulamentou a extinção do voto de qualidade e tal necessidade de regulamentação, acaso superada a questão da competência, não foi prevista na lei que extinguiu o voto de qualidade já que, se o fosse, a lei assim disporia sobre.
O entendimento do Ministério da Economia é no sentido de que, ao extinguir o voto de qualidade e determinar o julgamento favorável ao contribuinte, “em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário”, a lei restringe tal procedimento aos casos de julgamento de autos de infração e de notificações de lançamento, podendo subsistir o voto de qualidade em outras situações.
Demonstrando verdadeira sanha arrecadatória, a portaria prevê, por exemplo, a manutenção do voto de qualidade no caso de empate em processos do CARF nos quais figurem responsáveis tributários, como, por exemplo, o administrador da sociedade. Logo, num esforço para lá de criativo, traz-se a hipótese de manutenção do voto de qualidade quando houver a manutenção do auto de infração lavrado contra a empresa e existir empate quanto à questão da responsabilidade do administrador.
Segundo o veiculado na imprensa, o fundamento para manutenção da cobrança em relação ao responsável residira no fato de que a lei que extinguiu o voto de qualidade determinou o julgamento favorável ao contribuinte e, não, ao sujeito passivo; situação que excluiria a figura do responsável. No entanto, percebe-se que a portaria preteriu a redação do artigo da lei que previu a extinção do voto de qualidade “nos casos de exigência do crédito tributário”, o que revelaria a sua abrangência.
Portanto, como afirmado pela própria OAB, através de seu Conselho Federal, em nota a respeito da portaria, “(…) essa medida, ao incorrer em abuso de interpretação, elevará a litigiosidade, que foi justamente o resultado que se buscava evitar, e causará prejuízos tanto aos contribuintes quanto à Fazenda Nacional”.
Não há como perpetuar a cobrança de tributo por caminhos que não sejam permeados pela legalidade e pela constitucionalidade. As tentativas em sentido contrário devem ser combatidas pela sociedade civil organizada e afastadas pelo Poder Judiciário com veemência.
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